2017-10-21

Profissão: cliente

Ultimamente parece haver alguma histeria sobre a substituição do Homem pela Máquina, no que às tarefas diz respeito. Alguma apreensão é compreensível, mas é preciso compreender como chegámos até aqui. E a culpa não está toda no lado das máquinas, nem no lado das organizações que perseguem o lucro e exploram ao máximo o trabalho de outrem. Nunca vi ninguém traçar linhas vermelhas, apesar de me sentir com vontade de traçar uma. A grande distribuição quer que eu me encarregue de pesar os produtos vendidos a granel, fazer a minha própria conta e pagamento. Já não bastava nos terem amestrado para irmos buscar os produtos ao armazém/estante, felizes por nos sentirmos independentes e com hipótese de escolha, completamente manietados por técnicas de vendas que não dominamos. Esta tendência de que quem forneça um produto não inclua o serviço em que disponibiliza ao cliente o dito produto é velha e, com o advento da automação, agravou-se substancialmente. Naturalmente não defendo que tarefas repetitivas e sem qualquer valor acrescentado continuem a ser realizadas por pessoas. As centrais telefónicas de comutação automática e os elevadores cujos botões podem ser manobrados por qualquer pessoa são sinais de evolução sem qualquer lado negativo. Mas nas pessoas incluo, obviamente, o cliente. A tendência do auto-serviço que induz o cliente a trabalhar, sem receber uma compensação por isso, apenas maximiza o lucro. São raras as gasolineiras onde o cliente não seja obrigado a pegar na pistola da bomba de abastecimento. Nas portagens, praticamente desapareceram os portageiros. Nalgumas auto-estradas até o próprio meio de pagamento deixou de contemplar todas as alternativas previstas na lei, como se a moeda do estado tivesse perdido valor naquele pedaço do seu próprio território. Há até quem alegremente pague mais por pratos em restaurantes em que dão ao cliente o privilégio de cozinhar parte da sua refeição. E tal como na liberalização dos preços, se percebeu rapidamente que, todos correm a nivelá-los por cima, também na substituição dos funcionários pelos clientes se viu que o lucro não serve para remunerar quem paga a conta. Na distribuição da energia eléctrica, e de outros serviços, há mais um serviço que o cliente tem que disponibilizar: a tele-contagem. Não fornecendo esse serviço, arrisca-se a flutuações no valor das facturas mensais e respectivos acertos, numa complexidade de valores estimados (bastante mal, muitas das vezes, diga-se de passagem) e respectivos acertos que só o fornecedor de energia parece compreender. Ele ou os seus computadores, cujo software parece favorecer sistematicamente o próprio. Sacar uns euros a uns milhões de utilizadores antecipadamente, deve aumentar o rendimento. Com a lei, obrigaram o fornecedor a ler a indicação dos contadores de seis em seis meses, o que para ele parece intervalo demasiado curto. Curiosamente a tele-contagem parece avançar em passo de caracol, apesar do colosso da empresa pública do estado chinês que domina a distribuição eléctrica em Portugal (os fanáticos das privatizações, permitiram uma nacionalização para um estado estrangeiro. Ou duas se contarmos com a REN, uma empresa ainda mais estratégica). E agora, para o leitor não se habituar mal, acrescente mais alguns exemplos e tire conclusões…

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