2013-01-02

Os mais (des)afortunados

Contrastando com o fatalismo que parece ser apanágio dos portugueses, reconheço um optimismo desproporcionado perante a adversidade. Basta atentar em qualquer observação sobre um acidente ou sobre uma doença grave onde alguém conhecido se vê envolvido (idem para situações menos graves).
Imaginem que alguém decide ir cortar lenha com uma rebarbadora. É obviamente uma má decisão utilizar uma ferramenta inadequada. E piora bastante, dado tratar-se de uma tarefa potencialmente perigosa. Colocada a ferramenta errada nas mãos erradas, os dados estão lançados.
Tudo corre mal quando o disco prende na madeira, fazendo saltar a máquina em funcionamento das mãos que a seguram, enterrando uma parte do disco num dos gémeos de uma das pernas. O sangue jorra e a capacidade motora fica dramaticamente diminuída. Estando o indivíduo num local mais ou menos ermo onde não consegue chamar por auxílio, resta-lhe arrastar-se até à estrada onde alguém que passa lhe acaba por acudir.
É fácil imaginar comentários do género: "ele ainda teve sorte por alguém ter passado" ou "felizmente não se feriu com mais gravidade" ou ainda "o disco da rebarbadora estava gasto. Se estivesse mais afiado cortava-lhe a perna".
E o que parecia não passar de aselhice, transformou-se apenas num azar. O qual nem sequer foi maior, por ter havido sorte à mistura. Um fado que, embora tristonho, tem uma reviravolta final animadora. E tudo acabou bem.
Imaginemos agora que, apesar do socorro, a perna ficou perdida. "Felizmente não morreu". "Perdeu a perna mas salvaram-lhe a vida".
E se tivesse morrido? "Esvair-se em sangue atenuou bastante as dores iniciais que deve ter sentido. No fim, nem terá sofrido muito"...

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