2012-12-25

Toma e embrulha

Não sei se por diversão, se por maldade, este ano adoptei uma técnica bastante ecológica. Em vez de embrulhar as prendas e entregá-las em mãos aos destinatários, optei por usar a técnica do toma e embrulha. Na realidade, o toma foi bastante subtil. E o embrulha ficou ao critério de cada destinatário.
Antes que os leitores comecem a pensar em perfídias, explico que consistia apenas em colocar as prendas discretamente no meio dos pertences do aniversariante ou do destinatário natalino. Sem aviso, coube ao receptor detectar a novidade e concluir que se tratava de uma oferta presente. E é delicioso reparar quando não se repara na novidade. Quando é preciso ajudar a detectar o presente.
Obviamente esta técnica deve ser executada com supervisão do oferente. E o oferente necessita de ter acesso com permissão aos bens do ofertado. Ninguém quereria que a prenda fosse desviada por outrem ou danificada pelo próprio apenas porque não detectada...

2012-12-16

Dobrar ou virar a esquina?

Perdemos a conta a quantas esquinas passamos ao longo da nossa vida. Isto apesar de algumas terem deixado marcas indeléveis.
Mas não ficámos agarrados a elas. Ainda que a vontade fosse muita e, numa fase inicial, até marcas de unhas tenhamos lá deixado.
Seguimos o nosso caminho sem as esquecermos, sem as ignorarmos.
E quando encontramos uma nova, não pensamos no que ficou para trás. Tentamos imaginar o que poderá estar à nossa frente. O que poderá estar para além dela. O que poderá acontecer se a dobrarmos. E essa expectativa tem tanto de atractiva como de assustadora. A esquina desconhecida exerce fascínio especialmente por isso. Pela dualidade. E quando a encaramos de frente e vemos os dois lados ao mesmo tempo, percebemos se chegámos à esquina certa.
Chegar à esquina certa, não é o mesmo que chegar à esquina definitiva. Todas tendem a ser provisórias, até prova em contrário. E essa prova cabe ao tempo. E é preciso tanto tempo, quanto o tempo que nos for concedido, a partir do momento em que lá chegamos.
De frente para a esquina, conseguimos rever o percurso passado e tentamos antever o futuro. Após dobrá-la, não ficamos com o dom da clarividência. Não ficamos cheios de certezas. As dúvidas são suficientemente inquietantes para que não nos acomodemos, não devendo impossibilitar-nos de pararmos ou avançarmos, consoante nos aprouver.
É entre esquinas que mais claramente podemos reflectir. Não estando à sombra de uma delas, podemos melhor avaliar as que dobrámos e virámos. Poderá provocar algum desconforto, mas essa mesma sensação acaba por funcionar como motivação. Para avançar.
Após dobrá-la, podemos olhar para trás e verificar que, por mais marcas que lá possamos ter deixado, ela mantém a sua forma. E não adianta tentar lá voltar e bater-lhe com a cabeça. Acabaríamos ainda mais magoados.

2012-11-19

O amor é tramado e parte

Tece uma trama que nos enreda, quase sem darmos por isso. Sabemos que algo nos começa a toldar os movimentos e a razão. A embaraçar os momentos e o coração. A entrelaçar os sentimentos e a emoção. Só nos apercebemos quando é tarde. Quando estamos enredados. E nunca entediados.
Por mais experientes que sejamos, somos surpreendidos pelo poder deste atropelamento. Que nos assalta. Que nos esmaga. Que nos arrebata. Por mais que tentemos manter os pés no chão. Por mais que queiramos resistir. Por mais que a razão nos tente dizer que não. Que não vai dar. Que não vai resultar. Que dá demasiado que pensar.
Pensamos ter o controlo. Pensamos conseguir superar. Pensamos que sim. Que já passou. Que já lá vai. Que o amor partiu. Para não voltar, não voltamos. Voltamos as costas. Voltamos a mudar de rumo. Rumamos a outro porto. Partimos, enquanto o próprio amor parte, deixando cacos à sua partida.
No entanto, parece que todos os caminhos vão dar a Roma. Num ou noutro sentido...

2012-11-09

País de ofendidozinhos

Vivemos num país de pessoas que anseiam por uma desculpa para se exaltarem. Para deixarem de fazer bem, por uma razão qualquer, por mais pequena que seja. Somos pequeninos e invejosos. Quando cheira a sangue, precipitamo-nos para dar mais um pontapé no indivíduo que sangra. Antes, gritamos "quem nos agarrar?", enquanto o dito ainda está de pé. Depois de caído, carregamos. Queremos carregar com o dedo na ferida, mas só se nos sentirmos seguros de não levar uma resposta. Gostamos de protagonismo, ainda que seja à custa do esforço alheio e nunca do nosso.
Gostamos de tomar uma parte por um todo. Como se algo ou alguém ficasse definido apenas por uma faceta. Como se a nossa tacanhez quisesse mostrar à tacanhez de outrem que é maior e mais poderosa.
As redes sociais assentam que nem uma luva a este nosso desejo pequenino de sermos pequeninos. De sermos mesquinhos. De ignorarmos tudo o que de bem possa ter sido feito até ali, se tivermos uma oportunidade de crítica destrutiva. Ignoramos a construtiva, principalmente se nos for dirigida.
Somos pequenos selvagens que não toleram um dedo acusador. Uma tendência de ordem. Um diminuir dos direitos perante a exigência dos deveres.
É tão simples partilhar vídeos, fotos, textos e pensamentos de outros. Fazer um gosto (seja lá o que isso for) independentemente de ser apropriado ou nem por isso. Mais complicado é pensar pela própria cabeça e não incorporar alegremente o rebanho da carneirada.
E se querem ignorar o sábio conselho de não comer bife a todas as refeições por meras razões de saúde, mostrem que comem porque têm dinheiro para isso. E o que sobrar, doem para o Banco Alimentar.

2012-10-19

Pretensiosamente bom

Aquilo que eu gosto é que é bom. Aquilo que não gosto não tem qualidade. Quem não gosta daquilo que eu gosto, não sabe o que é bom. Não sabe como eu sei. Como eu julgo saber. E julgo bastante.
Normalmente, juiz em causa própria, julgo como bom ou mau o que despertar o meu interesse. Ignoro tudo o resto. O resto não me interessa. Logo, também não interessa. Nem como nota de rodapé.
Atiro as propostas desinteressantes para longe daquilo que gosto.

O que não seria bom, seria gostarmos todos exactamente das mesmas coisas. A pluralidade tem destas coisas. Aumenta o interesse ao mesmo tempo que aumenta o conflito. Como a maioria não gosta de permanente conflito, rodeia-se de quem gosta do mesmo, ainda que com diferenças subtis.

2012-09-26

Espírito de contradição

Quando me perguntam se tenho fome, pergunto quase imediatamente o que há para eu comer (não que tenha má boca).
Se me querem inquirir sobre o tipo de utilizador que sou, vejo o utilizador doméstico e procuro a opção utilizador selvagem (ainda que sem sucesso).
Na opção sobre o sexo, quero escolher que gosto muito e não o género (o qual tem obviamente muita influência no que eu gosto).
Quando me ordenam para algo fazer, sou mais rápido a contrariar a ordem do que a justificar a acção (e tantas vezes a ordem ainda que correcta, não me satisfaz).
Se me dizem para algo (não) fazer, pretendendo com isso dizer precisamente o contrário, arriscam a que (nada) faça (se me disserem directamente o que pretendem, arriscam a cair numa ordem directa).
E neste espírito me mantenho preso a ser livre.

2012-06-21

Só à palmada

Ela exagerou no seu esforço. Tentou ir além do que as suas forças permitiam. O exercício físico deixava-a louca. E não era coisa pouca.
O corpo sempre a esforçar, sem lhe permitir descansar. Sem lhe dar descanso. "Quem corre por gosto não cansa", dizem, sem afirmarem que uma tal corredora nunca descansa.
Há quem tenha tanta energia que parece inesgotável. E nesse erro caiu ela própria. Em cima da passadeira rolante corria, indiferente aos pedidos do seu próprio corpo para parar. Ou até mesmo para abrandar. O objectivo era ir mais longe. Estar durante mais tempo. Gastar o maior número de calorias. Derreter a maior quantidade de gordura.
E quando, embriagada pelo prazer que o exercício lhe proporcionava, o seu próprio corpo desfaleceu, ela tombou sobre a consola de comando da passadeira, ficando pendurada com o tronco para um dos lados e as pernas para o outro lado.
O alvoroço foi muito e vários acorreram em seu auxílio. E, lá chegados, próximos, rapidamente concluíram que o melhor seria darem-lhe umas palmadas nas bochechas. Até que estas ganhassem cor e ela reanimasse, voltando a si.

2012-06-08

A manada

Não vi um finlandês preocupado com os gastos exorbitantes dos portugueses em telemóveis. Não vi um alemão preocupado com o excessivo crédito assumido por portugueses para adquirir carros, novos e usados, de marcas alemãs. Muito menos com a aquisição de submarinos pelo Estado Português.
Aparentemente há vários preocupados com as dívidas excessivas contraídas pelos portugueses.
Aparentemente, conseguem ver a Europa como um somatório de compartimentos estanques. Como se a situação de uns, não pudesse vir a influenciar a situação dos outros. Pensam que a Europa poderá ser vista como uma manada, onde os mais lentos e mais fracos poderão ser sacrificados, salvando os mais velozes e mais valentes dos predadores.
Apesar de terem razão na metáfora, esquecem-se da totalidade. Que os predadores são mais que muitos. E depois de tratarem dos mais pequenos, que mal dão para lhes saciar o apetite, virar-se-ão para os maiores.
Curiosamente os predadores, quais animais irracionais, ainda não se aperceberam que, à medida que as vítimas caírem, também eles ficarão em vias de extinção.

2012-06-06

Uma pequena parte

Há sempre uma ponta de egoísmo no sentimento que acompanha um ente querido que parte, que se afasta e/ou que termina uma relação connosco. Por muito que desejemos a felicidade do ausente, ficamos infelizes no presente. Infelizes por essa felicidade deixar de passar por nós no futuro.
E não deveria ser assim. Não deveríamos ficar agarrados ao passado, não libertando os nossos sentimentos completamente. A frustração das falhas que cometemos ainda é compreensível. Mas por terem sido falhas. E só por isso. Pois devemos lembrá-las apenas para não voltarmos a repeti-las.
As desculpas são mais que muitas. Por isto, por aquilo, por aquele outro, há sempre razões para os nossos falhanços. E até há para os falhanços dos outros. Mesmo que não os consigamos ver com a mesma nitidez. Com a mesma clareza com que desculpamos os nossos.
O importante é que, ainda que uma pequena parte de nós fique a remoer, a nossa maior parte avance para o futuro com isto presente: os erros são inevitáveis.
Mas serão tão mais indesculpáveis quanto mais repetentes e persistentes forem.

2012-05-15

Incendiário

Gostaria de partilhar convosco (três coisas raríssimas, só por si, quanto mais pelo conjunto), coisas interessantes que se podem ler numa embalagem de um isqueiro doméstico. Não confundir com isqueiros selvagens, os quais não costumam obedecer à norma ISO 22702, nem costumam deixar-se embalar facilmente.
"Acender isqueiro multi-usos longe da cara e das roupas" - eu acrescentaria que longe de seja o que for que não se queira ver queimado nem a arder. A cara e as roupas serão apenas uma pequena parte do nosso corpo e das nossas posses que queremos manter longe de uma chama.
Talvez por isso o aviso de manter afastado do alcance das crianças.
"PERIGO
Contém gás Butano sob pressão" - e ainda bem ou teria que ser recarregado caso o pretendêssemos usar. O que não raras vezes acontece quando adquirimos algo.
"Extremamente inflamável" - o isqueiro ou o gás butano? Espero que seja o gás, ou seria perigoso tentar acender um isqueiro extremamente inflamável. Estou ansioso por ler as instruções da recarga.
"Não usar perto de fogo, chama ou faíscas" - ora se tivéssemos uma destas coisas, necessitaríamos dele?
"Assegurar-se que a chama fica completamente apagada após cada utilização" - para além de ser um conselho eminentemente económico, acaba por ser prático não ter o esquecimento de o guardar ainda com a chama a arder.
"Não usar para acender cigarros, charutos ou cachimbos" - esta parece-me a recomendação mais surpreendente. Principalmente quando não acompanhada de uma pequena explicação. Não é que esteja a pensar manter aceso um daqueles vícios. Surpreende-me que um isqueiro não possa ser usado como isqueiro para toxicodependentes. Mas nem uma palavra sobre o seu uso para aquecer colheres de chá ou de sopa...
"Não manter aceso durante mais de 30 segundos" - que fraquinho...
Será que posso acender uma churrasqueira ou uma lareira? E incendiar um chouriço banhado em álcool?
Obviamente afastado da cara e das roupas.

2012-04-23

Prazer de condução

Tirei a carta tarde. Isso traduziu-se naturalmente em alguma dificuldade na aprendizagem. Apesar de após encartado ter começado a conduzir, a condução era de fraca qualidade. Cheia de hesitações e erros.
Nada de muito grave, mas com prejuízo evidente na suavidade da condução. E até alguns pequenos acidentes. Digamos que não deixava saudades e que só por parcialidade seria possível apreciá-la.
O tempo foi passando, o número de kilómetros aumentando e a facilidade e qualidade melhorando. A isto junta-se o facto do número de veículos conduzidos ter igualmente aumentado. A habilitação e habilidade foi-se tornando cada vez mais abrangente.
Vendo bem as coisas, os princípios que estão por detrás da condução de cada veículo são semelhantes, com as devidas adaptações. Os comandos poderão ter configurações e tamanhos diferentes, mas nunca são totalmente diversos que não permitam o seu reconhecimento. Poderá demorar a dominar a máquina. No fundo é apenas uma questão de dedicação e de tempo. Também sensibilidade é necessária para reconhecer a resposta e o que faz melhorar essa resposta.
Muitas vezes há o desejo de conduzir máquinas cada vez mais potentes. Há no entanto um preço a pagar. Ou vários. A condução terá que ser efectuada com mais atenção. Não há tanta margem para erros. A manutenção além de cara poderá complicada. E nada disto refreia o desejo. Por vezes apenas o aumenta.
Independentemente do interesse que os veículos alheios possam inspirar, não há nada como conduzir o nosso. Aquele a quem já estamos habituados. Conhecemos o seu corpo quase como o nosso. Sabemos interpretar a sua resposta em cada contexto. No início é uma verdadeira aventura. Com o passar do tempo e aumento da prática, o que nos faltar em aventura, sobrar-nos-á em prazer.

2012-04-11

Metal da pesada

O José Luís Peixoto afirmou numa entrevista há dias, a propósito dos seus gostos musicais, qualquer coisa do estilo: que já não tem 17 anos. Tem 37 anos e por isso ouve vários estilos de música.
Eu não tenho nem uma nem outra idade, apesar de já ter tido ambas, e oiço de tudo. Porque não sou surdo.
Apesar de não gostar de formatações redutoras de músicas ou de artistas, confesso que gosto particularmente de músicas associadas ao estilo Heavy Metal, seja lá o que isso for. E dentro disso, encontro uma variedade tão grande, que não preciso de procurar satisfação noutros estilos.
De vez em quando dou uma espreitadela naquelas músicas boas de se ver. Porque os olhos também comem, ainda que não saboreiem.
Isto é bem capaz de ser básico. Mas, basicamente, é disto que gosto, ainda que nem tudo o que encaixe neste estilo me satisfaça.

2012-03-31

Reflexo

Qualquer forma de comunicação revela muito do seu emissor. E uma das que mais reflectem a verdadeira imagem do seu autor será a escrita.
Não é a mais fácil de descodificar. Talvez por não ser fácil de codificar. Ao leitor exige que leia. Que se esforce. Que compreenda. Não sei qual das premissas anteriores terá caído mais em desuso. Sei que todas elas parecem ter embarcado na barca da crise. Talvez empurradas pela exiguidade do tempo, que parece ter acelerado o passo.
Quem fica para trás, agarrado a livros em papel e máquinas de escrever, ainda que electrónicas, parece condenado ao ostracismo. Condenado a ter que abraçar novas formas de comunicação, para ter receptores da respectiva mensagem.
Curiosamente, reflectindo em todas as novas oportunidades que as novas tecnologias, algumas já não tão novas assim, oferecem, chego à conclusão que a mensagem, longe de estar refinada, cada vez mais parece estar mais esvaziada.
O conteúdo, talvez ofuscado pelas luzes brilhantes dos novos canais de comunicação, parece paulatinamente ter-se evaporado. Está cada vez mais leve, menos satisfatório. Porque nem sempre é o que tem melhor aspecto o que mais nos cativa. O que mais nos satisfaz.
E tudo o que escrevemos, quer seja formalmente quer informalmente, reflecte o que somos. O que pretendemos transmitir. E tal como na comunicação presencial, é quando nos apresentamos informalmente que mais mostramos aquilo que realmente somos.

2012-02-18

Lançamento

Para os leitores menos informados, informo que lancei um novo blog e não sei onde foi parar. Poderão tentar encontrá-lo em Notícias pérfidas, onde, talvez, também haja fogo.
Não pretendo com isto dar-vos muita informação. Pretendo que os menos informados fiquem um bocadinho mais informados. E os mais informados fiquem um bocadinho mais divertidos. Se conseguirem, no meio de tanta perfídia. E o pérfido sou eu...

2012-02-15

Hierarquias amistosas

Nunca gostei de classificações sobre gostos. A perda de tempo em ordenar aquilo que gosto mais agrava-se com o carácter efémero desta ordenação. Não quero com isto afirmar que, entre duas situações, eu não saiba de qual gosto mais. Normalmente sei. Mas as vezes que não sei, não me provocam insónias.
À mutabilidade da hierarquia junta-se o facto da maioria das coisas nem serem comparáveis. São, na maioria das vezes, apenas diferentes.
Uma eventual ordenação, ainda que fosse perene, nenhum valor acrescentaria ao sentimento. E o que se sente, não se submete a ordens.

2012-01-19

Uno

Por momentos fomos um. O mundo tinha sido expulso para além das nossas fronteiras unificadas. Nem sequer reparámos se nos observava, com a inveja de quem é forçado a ficar ver, sem poder participar.
Foram momentos efémeros que deixaram memórias perenes. Que ajudaram a fortalecer a união. A preterir os outros, preferindo-nos.
Mas o mundo acaba por regressar. Talvez movido pela tal inveja, fazendo questão de se intrometer. Fazendo questão de desgastar. Forjando desculpas para faltas de comunhão. Parecendo gozar à medida que a erosão deixava marcas profundas. Sentindo que cada dia era dado mais um passo em direcção ao fim. Fim que paulatinamente se aproximava, gelando à sua passagem, qual Inverno enregelador.
E quando o fim, que se adivinhava, finalmente chegou, o mundo nem se dignou festejar. Pareceu ter reduzido a sua importância a uma insignificância. E quando um, chegando ao limite, gritou uno, o único prémio que recebeu foram as suas próprias lágrimas amargas.

2012-01-03

A vaca fria

Não percebo a fixação que algumas pessoas têm pela neve. Percebo que a achem linda. Mas isso não me chega. Ela pode ser linda mas é gelada. Como se isso não bastasse, derrete-se logo mal se lhe põe as mãos em cima.
Depois tem aquela maneira de viver das aparências. Parece toda branquinha e, ao aproximar-mo-nos mais, começamos a ver a porcaria. Começamos a perceber que aquilo que parecia ser de um branco imaculado, está cheio de manchas acinzentadas. Isto se não estiver com umas muito suspeitas cores mais garridas...
Apesar de se derreter com facilidade, pode ocultar o seu escorregadio amigo gelo. Aliás, basta pressioná-la para ele aparecer logo. Primeiro é só negações, ninguém escorrega, ninguém cai. Mas por debaixo dela, ele se esconde. À espera de trair mais alguém.
No entanto, espero que, o facto de nunca a ter conhecido pessoalmente, não me tenha prejudicado o julgamento...